Sonhos esbranquiçados

“É apenas mais uma madrugada” – pensou ele enquanto baixava com violência o rolo de madeira sobre a massa tenra e se virava. O seu gorro outrora branco estava amarelo e manchado, revelando às mentes mais perspicazes as práticas habituais a que o seu dono se dedicava. Dirigindo-se à despensa disse para o vulto junto à janela: “Foi nojento, cozinhas mal como a merda. Pôe-te lá fora. ” e coçou o rabo com uma haste da batedeira.

Tinha sido só mais um souflê de ananás com abacate, mais uma sobremesa que prometia ser requintada, mas que tinha acabado por dar numa banal mousse de pacote. Era triste. O seu vício secreto de se deliciar com a comida preparada por roliças cozinheiras estava a tornar-se perigoso, sobretudo para o seu fino palato.

Ainda se lembrava de como a tinha seduzido em frente ao salão paroquial. Reparou nela primeiro pelos seus fartos seios, depois pelo Pantagruel que trazia debaixo de um dos braços. Estava com mais 3 amigas, numa reunião de alunas de cursos de cozinha por correspondência, como agora estava na moda. A sua camisola suja de chocolate foi o toque que fez com avançasse.

Simulou passar casualmente pelo grupo de amigas, e subtilmente fingiu tropeçar e esbarrar com a massa imponente que era o seu alvo, um autêntico bisonte americano. Desculpas trocadas e um dedo de conversa chegou para irem beber um café na esquina. Ele padeiro e cozinheiro nas horas vagas, ela cozinheira na tasca da Dona Josefa, e o desejo entre ambos cresceu mais rápido que claras em castelo a serem batidas. Saíram e dirigiram-se para a padaria onde ele trabalhava na sua carrinha de distribuição do pão.

Enquanto ele guiava para o seu destino, ela começou a descrever as suas últimas habilidades culinárias, enquanto se esfregava com os éclairs recheados que se encontravam no banco traseiro. Ele delirou e tentou lamber o creme de um dos pés da sua cozinheira recém seduzida, quase perdendo o controlo da viatura à medida que os tabuleiros de croissants caíam na parte detrás da carrinha.

Chegaram à padaria tão ansiosos como lambuzados, e enquanto ele vestia a sua farda ela ia-lhe colocando o gorro e manuseando os instrumentos culinários que tinha à mão. Teve estertores de prazer enquanto ela batia e batia, fazendo crescer cada vez mais o sucedâneo de ananás, apenas vestida com um avental que mal cobria a sua nudez de vénus de milo, ou pelo menos as suas dobras de gordura abundantes. Num ambiente de transe simultâneo ele devorou o souflê que ela preparou, enquanto ele a estimulava com o ralador de queijo que usava para dar o toque final à sua carbonara. A orgia culinária repetiu-se vezes e vezes sem conta, acabando as iguarias por parecerem cada vez mais rotineiras e simples. Estava cheio, e só lhe apetecia vomitar.

Lembrou-se onde estava ao olhar para o boião gigantesco do fermento. “Ver se a outra já se foi para continuar a tratar da massa dos brioches.” Pensou, enquanto saía da pequena divisória, descobrindo a cozinheira já vestida mas a comer um prato de sonhos recheados que ele tinha preparado na noite anterior. “Já te disse para saíres minha Filipa Vacondeus de cantina universitária!” insultou, esperando que ela se fosse rapidamente embora. Largou os sonhos, levantou-se movendo os seus 140 kilos de gordura natural e dirigiu a palavra ao padeiro

-“Mijei no souflé... diverte-te”- disse sorrindo

Ele olhou para ela, sorriu ironicamente abanando a cabeça e, condescendente, atirou:

-“ De onde pensas que o recheio branco e leitoso dos sonhos que estás a comer vem? Engasga-te!”

Comentários

alphatocopherol disse…
Isto tá a ficar ao rubro LOL!!!
Viva a ausência de validade literária!!!!!!!!
Chas. disse…
Muito Cu linário ai meu deus onde isto ja vai, qq dia vem para aqui falar do palhaço de circo gay e da trapezista de 200 kilos... Ou nao.
Captain Dildough disse…
Um verdadeiro fuzilamento palavral de gags culinários e uma sátira deliciosa ao texto matriz que todos conhecemos... :)
Decididamente um dos melhores textos do autor, na linha visualmente explícita dos seus recentes trabalhos!
E o que sucede ao "sucedâneo"? A boulabaisse?
Captain Dildough disse…
Um verdadeiro fuzilamento palavral de gags culinários e uma sátira deliciosa ao texto matriz que todos conhecemos... :)
Decididamente um dos melhores textos do autor, na linha visualmente explícita dos seus recentes trabalhos!
E o que sucede ao "sucedâneo"? A boulabaisse?

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