Esse lugar é meu!!

Era uma madrugada normal, num dia de trabalho normal, num comboio da CP da linha de Sintra que de tão normal, até me irrita e faz escrever uma asneirada muito muito feia e gratuita (ao contrário do preço dos passes): chissa! As pessoas entravam em todas as estações de um modo quase ordeiro, aparentando uma calma que era tudo menos isso mesmo. Na estação do Cacém a tragédia aconteceu.

A Dona Idalina, furando por entre os magotes de passageiros, vislumbrou um lugar sentado perdido. “As minhas pernas carregadinhas de varizes e veias rebentadas têm de descansar!!” pensou a senhora de meia idade (se se considerar uma idade inteira como 120 anos para aí, claro) com os seus botões, que fechavam um vestido envolvendo os seus 170 kilogramas de pura banha, enquanto se dirigia para o descanso semi paradisíaco.

Na extremidade oposta da carruagem entrava Mané Matimba, que embora habitante de um bairro degradado era um trabalhador dedicado, versado em telecomunicações de ponta: ponta da naifa para lá – telemóvel para cá. O início de dia era sempre cansativo, pois ainda não se tinha habituado a correr de entre carruagem em carruagem depois de ver os revisores. Naquele dia precisava de se sentar, e um lugar vazio pareceu luzir como se para o chamar. “Man, dia de sôrte hôje!”.

Os dois passageiros dirigiam-se apressadamente para o lugar vago, quando se aperceberam um do outro. A tensão cresceu instantaneamente: a Dona Idalina fincou as suas patas paquidérmicas com força no chão, e Matimba agarrou ostensivamente o rádio gigantesco que trazia ao ombro. O ar ficou carregado de electricidade (não sei porquê, mas deve ser por eu estar a estudar física – se fosse carregado de merda era pior, ainda era mais estranho, e cheirava pior) e, repentinamente, o comboio estremeceu. As luzes acenderam-se em pleno dia, mas eram vermelhas e azuis, violentamente intermitentes. Do meio do nada surgiu então o maquinista.

- Senhôres e senhóóóras, o maior espectáculo do mundo está prestes a começarrr! – gritou o recém surgido
- O Circo?!?! – perguntou uma criancinha esperançada
- Não, não é o circo! – respondeu o maquinista
- Um espectáculo de acrobacias aéreas?? – perguntou outro passageiro
- Não, também não é isso! – retorquiu uma vez mais o apresentador, incomodado
- Uma orgia sexual de prostitutas de idade avançada de biquini?? – perguntou um pervertido completamente babado
- Não PORRA, é o fantástico, o admirável, o inebriante DUELO POR UM LUGAR SENTADO NUM COMBOIO DA LINHA DE SINTRA!! (Momento gentilmente patrocinado por CP – Caminhos de Ferro Portugueses) – berrou o maquinista
- Essa merdice?? – respondeu um velho, virando as costas – Isso vemos nós todos os dias! Ah!
- Errr...pois – gaguejou o apresentador – Bom, no vosso canto esquerdo, com o vestido foleiro e tantos pneus de gordura como anos de vida... DONA IDALINA!! – a senhora respondeu urrando e batendo com os punhos no peito sob o aplauso dos passageiros – No vosso canto direito, com o fato de treino roubado e debaixo de uma montanha de brincos, correntes de ouro, o rádio a tocar 50 Cent e - Ouch... que é isto? Olha aí! Nada de stresses, leva lá isso – e agora a minha carteira.... MANÈÉÉ MATIMBA!! – o outro interveniente guardou a carteira “emprestada” e ensaiou uns passos tribais ao som da música, debaixo de ruidosa ovação da secção mais sombria da carruagem. O apresentador/maquinista deu dois saltos e gritou – Que comece o combate!!

Dona Idalina investiu violentamente na direcção do jovem, que se esquivou rodeando o varão, agredindo com o rádio as costas gelatinosas da sua oponente, que pareceu nem o sentir. Virando-se, rodou a sua mala carregada da quinquilharia típica feminina que pesa toneladas e arremessou -a na direcção de Matimba. Este, aterrorizado recuou, tropeçando nas suas calças de fato de treino e estatelando-se ao comprido. A mala voou por cima do seu oponente, indo acertar no pobre maquinista, esmigalhando instantaneamente o seu crânio. A velhota vendo a aparente vantagem, carregou novamente, só que com tanta força bruta desequilibrou o comboio desgovernado (sim sim, como se isso fosse possível) , que ginando nos carris se virou espectacularmente, provocando um aparatoso e destruidor acidente.

Por entre a amálgama metálica retorcida de metal, o pervertido babado rastejou e sentou-se numa cadeira que sobrevivera inexplicavelmente:
-Este lugar é meu ãhahãahã!!! – balbuciou enquanto se começava a masturbar.

Comentários

Chas. disse…
Apre. Imaginação fértil. Seria uma masturbação acidental?! A linha de sintra é a pioneira das histórias, não fosse o descarrilamento seria um episódio normal :P
Anónimo disse…
Pior que isso é quando os dois se fundem na Dona Idalina Matinga... Aí sim é que o caso é grave!!!

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